quarta-feira, 20 de abril de 2011

o cheiro do ralo

Ele entra. Coloca o violino em minha mesa. Não fala nada. Nem boa tarde. Fico em silêncio.
Afinal o interesse é dele. Então ele fala, quanto? Chuto, tanto. Ele coça a barba.
Esse violino deve ter história, chuto. Ele me olha. Seu olhar me incomoda. Ele pega o violino e sai.
Mas antes de fechar a porta, solta:
Aqui cheira a merda.
É o ralo.
Não. Não é não.
Claro que é.
O cheiro vem do ralo.
Ele entra e fecha a porta.
O cheiro vem de você.
Olha lá.
Levanto e caminho até o banheirinho.
Olha lá, o cheiro vem do ralinho.
Ele ri coçando a barba.
Quem usa esse banheiro?
Eu.
Quem mais?
Só eu.
Ele continua com o sorriso no rosto, solta:
E então, de onde vem o cheiro?"

(trecho de O Cheiro do Ralo, de Lourenço Mutarelli - livro que inspirou o filme).